Falar com animais não é “coisa de doido”: estudos indicam que quem conversa com pets é mais inteligente.
Pessoas que falam com os seus cães, gatos e até mesmo plantas vivem sendo ridicularizadas, são motivo de piadas a todo instante. Mas estas conversas não são inúteis, como muita gente acredita. Estudos indicam que os tutores que dialogam com os seus pets são mais inteligentes.
Viver com um cachorro ou gato e incorporá-lo à família traz inúmeros benefícios. Os pets nos obrigam a organizar uma rotina saudável, podem influenciar em relacionamentos amorosos e, além de serem excelentes parceiros de brincadeiras, também estimulam o desenvolvimento cognitivo das crianças.
O desenvolvimento da inteligência
De acordo com Megan Mueller, da Universidade Tufts (Massachusetts, EUA), que pesquisa a interação entre humanos e pets, existem duas condições básicas para a aquisição de qualquer forma de aprendizado:
- interessar-se pelo mundo ao redor e buscar interagir com ele;
- admitir que não sabe alguma coisa e formular hipóteses na tentativa de explicá-la.
Para satisfazer estas duas condições, é fundamental que o aprendiz, em qualquer idade, compreenda que não é o centro do mundo: existem diferenças de opiniões, interesses e vontades. Para uma criança pequena, entender que o mundo não existe para satisfazer os seus desejos é o ponto de partida para o aprendizado.
Ainda de acordo com Mueller, é mais fácil, para uma criança, descobrir que um cão ou gato é diferente e reage de formas diversas, do que perceber as diferenças em relação aos pais ou aos irmãos, por exemplo.
Tentar entender o pet, o que ele quer e precisa, é uma maneira eficaz de desenvolver a alteridade e a empatia, faculdades básicas para o entrosamento com a vida de relação. A partir desta primeira conquista – respeitar as necessidades e desejos dos peludos – o desenvolvimento cognitivo se torna mais rápido. Mas existem outros bons motivos para os bate-papos com cães e gatos.
Resolução de problemas
Quando um tutor conversa com o seu animal de estimação, praticamente tudo que ele diz não faz sentido lógico para o pet. O vocabulário de um gato ou de um cachorro é limitado; além disso, os pets ainda precisam decidir se querem ou não respeitar o que está sendo falado.
Quando se trata de adestramento, o ideal é usar palavras curtas, pronunciadas em tom firme e resoluto. É assim que cães e gatos aprendem o significado do “sim” e do “não”, por exemplo. Mas as conversas prolongadas trazem benefícios tanto para os tutores quanto para os pets.
Para cachorros e gatos, os benefícios dos diálogos são muitos: é um tempo exclusivo de interação com os humanos da família, em que se estabelecem e consolidam os vínculos de amizade e afeto.
Para os humanos, a simples verbalização dos problemas cotidianos é uma forma eficiente de delimitar as questões a serem resolvidas ou superadas. Durante as conversas, alguns desafios propostos pela vida podem ser equacionados. “Falar sobre o assunto” ajuda a encontrar as soluções possíveis.
Este efeito também pode ser obtido conversando com uma planta ou um objeto inanimado, mas, quando se fala com um pet, existem “respostas”: eles reagem ao tom de voz, a algumas palavras isoladas, oferecem (e pedem) carinho, etc.
Cuidar de animais de estimação está associado a altos níveis de empatia: cães e gatos têm pressa e precisam ter as suas demandas atendidas. Por isso, ter um pet é uma indicação terapêutica para todas as crianças, mas é especialmente benéfico para portadores de transtornos do espectro autista.
As conversas tornam o relacionamento mais concreto também para os adultos. Ao dialogar com os peludos, os tutores refazem o caminho da aquisição do conhecimento: identificar problemas, delimitá-los e, depois de reclamar um pouco, encontrar as soluções mais possíveis e viáveis.
Questão de confiança
Além de propor os problemas e encaminhar as respostas para cada situação, existe também a questão da confiança. Os humanos adultos mantêm um círculo muito limitado de amigos. Quando se consideram aqueles com quem se pode falar francamente sobre qualquer assunto, muitas pessoas descobrem que são muito poucos os amigos de verdade.
Ao conversar com os animais de estimação, não existem limites, nem preocupações com eventuais juízos de valor que venham a ser emitidos pelo interlocutor. Além disso, é certo que o gato e o cachorro não traem a confiança, não saem falando de assuntos íntimos para outras pessoas.
Desta forma, quem conversa com os pets pode falar sobre tudo, pelo tempo necessário, seja para um simples desabafo, seja para encontrar a maneira mais efetiva de superar uma crise ou encontrar uma solução para um desafio qualquer.
A antropomorfização
Alguns pesquisadores da Universidade Federal Fluminense (UFF) conduziram um estudo, publicado em 2018 pela Revista Brasileira de Zoociências, que analisou o impacto da antropomorfização de animais de estimação e companhia.
Antropomorfização é a atribuição de características mentais humanas a seres não humanos, como cães e gatos. É o mesmo fenômeno que levou algumas culturas a venerar animais, a quem eram atribuídos poderes extraordinários.
De acordo com os pesquisadores, ainda não existe um consenso sobre os resultados da antropomorfização. Eles podem ser benéficos, melhorando aspectos cognitivos e emocionais, mas também podem contribuir para o desenvolvimento de alguns transtornos mentais.
Seja como for, o estudo demonstrou que, respeitados os limites necessários, a tendência de atribuir qualidades humanas aos pets se baseia na criatividade e na inteligência, e não na ignorância ou na loucura.
Um tutor não deve se isolar do mundo, estabelecendo o relacionamento com os animais de estimação como suficiente para o equilíbrio emocional e o desenvolvimento da inteligência. Os humanos também precisam evitar transferir necessidades e desejos humanos aos pets, mas as conversas diárias são benéficas, estimulam a criatividade e a curiosidade. É uma boa maneira de decifrar os enigmas propostos pela vida, sempre lembrando que os nossos “solícitos interlocutores” não são humanos e não estão entendendo nadinha do que estamos falando.
A antropomorfização, de acordo com os pesquisadores, é uma característica de pessoas com vida mental muito ativa. Estes exercícios obrigam os nossos neurônios a trabalhar mais e essas conexões podem ser usadas em outras situações da vida de relação.