No final da última Era Glacial, que marca o início do Holoceno (atual período geológico da Terra), há 11 mil anos, os cachorros já eram velhos conhecidos dos humanos. A hipótese mais provável indica que, em algum momento entre 40 mil e 25 mil anos atrás, os avós dos nossos melhores amigos começaram a divergir do lobo-cinzento (Canis lupus), dando origem a uma nova espécie. O DNA dos cães primitivos é mais parecido com o das feras.
Um estudo de 2022, publicado por pesquisadores da Universidade de Tóquio (Japão), ainda em fase de revisão pela comunidade científica, indica que o ancestral mais próximo dos cachorros é o lobo-de-Honshu, uma subespécie do lobo-cinzento extinta no início do século 20. Mais de 98% do DNA é idêntico.
Uma curiosidade: só foi possível comparar o sequenciamento genético das duas espécies porque a população da região de Honshu mantinha o costume de mumificar lobos-de-Honshu e exibi-los acima das portas, para atrair sorte. As amostras de DNA foram extraídas de alguns desses exemplares, preservados em museus.
Os mais parecidos com lobos
Há 11 mil anos, todos os canídeos atuais já estavam espalhados pelo hemisfério norte. A partir do sudeste do continente, eles migraram para toda a Eurásia e América do Norte. Os cães já formavam uma espécie distinta e acompanhavam as migrações humanas. Nessa época, muito antes da domesticação de outros animais, como cavalos, cabras e ovelhas, os cachorros primitivos já eram grandes colaboradores.
Eles também sofreram modificações, a partir de cruzamentos seletivos. Os humanos conseguiram reforçar algumas características e atenuar outras. De acordo estudo do Instituto Francis Crick, de Londres (Inglaterra), cinco raças caninas já podiam ser avistadas.
Os acasalamentos seletivos continuaram no decorrer dos séculos. Os cães tiveram a aparência, o porte e o temperamento modelados de acordo com as necessidades humanas. A maioria das raças pequenas surgiu apenas a partir do final do século 18, mas o pug, ou um cachorro muito parecido com ele, já aparece em descrições e ilustrações chinesas de 700 AEC.
Isto significa que os cachorros, apesar de serem criados basicamente em função da utilidade – caça, guerra, guarda, pastoreio, etc. – já haviam cativado os humanos, uma vez que os “nanicos” são adotados basicamente como animais de companhia, apesar de serem muito úteis também para a caça de roedores, como ratos e marmotas.
Na década de 1990, com o desenvolvimento de técnicas para o sequenciamento do DNA, foi possível confirmar que os cães classificados como “primitivos” por causa da aparência física são mais parecidos também geneticamente com os lobos-cinzentos.
Todos os cães compartilham pelo menos 98% do DNA com os lobos-cinzentos e, como estes, mantêm várias características em comum: são gregários (vivem em grupos organizados), bastante adaptáveis a diferentes condições climáticas e topográficas, possuem olfato e audição excelentes, a gestação dura cerca de dois meses.
Em algumas raças, relacionadas a seguir, o DNA é ainda mais parecido. Vale lembrar que os cachorros e os lobos-cinzentos podem acasalar e gerar descendentes férteis – foi assim que surgiu o cão-lobo tchecoslovaco, por exemplo. Por isso, os nossos companheiros peludos são considerados uma subespécie do Canis lupus: o C. l. familiaris.
01. Afghan hound
Entre os cães de grande porte, o afghan hound é que apresenta o DNA mais parecido com o do lobo-cinzento. Antiquíssimo, tornou-se conhecido no Ocidente apenas em 1900. É um caçador solitário e ocupa a última posição no ranking da “Inteligência dos Cães”, publicado por Stanley Coren.
02. Akita
Existem dois dias: o japonês e o americano. A raça se desenvolveu nas regiões montanhosas do Japão e ficou muito popular no Período Edo (1603-1868), quando se destacou como cão de luta e acompanhante dos samurais. É um animal de grande porte, forte e independente.
03. Basenji
É uma das poucas raças desenvolvidas na África: no Egito, há registros de cães semelhantes aos atuais datados de mais de quatro mil anos. A maioria dos basenjis contemporâneos vive na região central do continente, adaptada à vida na floresta densa e úmida.
04. Chow-chow
Apesar de ser sempre comparado com ursos e leões, este cão da língua azul é um dos mais próximos aos ancestrais. Ele acompanha os chineses há cerca de dois mil anos, trabalhando na guarda de propriedades e no transporte de cargas. Grande e forte, o chow-chow é bastante desconfiado.
05. Husky siberiano
O husky siberiano, que tem parentesco com o samoieda e o malamute do Alasca, puxa trenós há milênios nas estepes geladas da Sibéria. É uma das raças mais parecidas fisicamente com os lobos, em função da estrutura anatômica e da pelagem farta e densa.
06. Lhasa apso
Mesmo parecido com um bibelô, este símbolo do Tibete é um excelente cão de guarda. Ele já exercia funções de guardião nos primeiros templos budistas, surgidos a partir de 500 AEC. Pequeno e de cara amassada, contrasta com os lobos, mas é muito próximo a eles.
07. Malamute do Alasca
A origem é incerta, mas estes cães já conviviam com povos indígenas no século 19, quando a região ainda pertencia à Rússia. Grande, peludo e impressionante, o malamute é um tremendo brincalhão, mas muito eficaz no trabalho de transporte. Ele foi personagem central na Corrida do Ouro.
08. Pequinês
Apesar do focinho achatado, os cães da raça guardam semelhanças inclusive fenotípicas com os lobos. Apegados aos tutores – eles acompanhavam os imperadores chineses pelo menos há 2.600 anos – eles são cautelosos com estranhos, o que os torna excelentes cães de guarda.
09. Podengo português
É uma das raças derivadas dos cães que acompanharam marinheiros fenícios nas travessias do mar Mediterrâneo, há cerca de 1.500 anos. Esta é uma das poucas raças portuguesas reconhecidas internacionalmente. O padrão oficial foi definido apenas em 1955.
10. Saluki
A raça surgiu no Oriente Médio e tornou-se popular no Egito antigo, onde foram encontrados exemplares mumificados nas tumbas de alguns faraós do Médio Império. O saluki também acompanhou mercadores que circulavam pela Rota da Seda. É um galgo bastante veloz.
11. Samoieda
A raça foi desenvolvida por antigos caçadores de renas da Sibéria. A semelhança física, a força e a resistência confirmam a ancestralidade. O samoieda tem um ar misterioso, com os lábios pretos contrastando com a pelagem branca, mas é um excelente companheiro, inclusive para crianças.
12. Shar-pei
Mais um cachorro chinês muito parecido geneticamente com os lobos, usado no pastoreio e no rastreamento. A carranca e as dobras e rugas na pele, para os chineses, afastam os maus espíritos e, por isso, a raça é muito apreciada. Assim como o chow-chow, o shar-pei também tem língua azul.
13. Shiba
É uma das raças mais populares do Japão. Ossadas muito parecidas com as dos cães atuais foram datadas de mais de cinco mil anos. De porte médio e bastante independente, ele é um dos símbolos da família imperial. O shiba é ancestral do akita.
14. Shih-tzu
É a raça com o DNA mais parecido com o dos lobos-cinzentos. Apesar do pequeno porte (um indicativo de que é um cão de companhia), ela já convivia com os chineses, indianos e mongóis há mais de 2.800 anos.
15. Spitz alemão
Ele se desenvolveu a partir de cães levados pelos vikings para a Alemanha entre os séculos 12 e 13. São cinco variedades: gigante (o keeshond), grande, médio, pequeno e anão (o lulu da Pomerânia, que, apesar do nome, não apresenta traço de nanismo). O grupo dos spitz engloba os cães mais primitivos.
16. Terrier tibetano
É um ancestral do lhasa apso, que surgiu a partir de cruzamentos entre cães da raça e spaniels do Tibete. Na verdade, ele não é um terrier, mas um cão de pastoreio de porte médio. É um animal muito amoroso, protetor de toda a família.