É possível adotar uma capivara como animal de estimação. Mas dá trabalho.
Você quer ter uma capivara como animal de estimação? É o seu sonho de infância? Viu os bichos no poluído rio Pinheiros, em São Paulo, e ficou com pena — ou com vontade de ter um para chamar de seu? Vá em frente. Tudo vale a pena quando a alma não é pequena.
Mas, talvez seja necessário fazer algumas adaptações em casa. É fundamental que haja espaço no quintal para instalar uma piscina, mesmo que seja daquelas de plástico, com uma capacidade de 200 litros, pelo menos. Uma capivara em apartamento, nem pensar. E não importa que você tenha uma banheira de hidromassagem.
O comportamento
A capivara costuma permanecer ativa durante o dia todo, com sonecas curtas e intermitentes, desde que não perceba a presença de um predador nas redondezas. De manhã e à tarde, elas preferem ficar dentro da água, principalmente para regular a temperatura corporal.
A procura por alimentos tem início no final da tarde, sofre uma pausa durante a madrugada e volta a ocorrer uma ou duas horas antes do amanhecer. Depois do lanche matutino, a capivara costuma descansar em pequenos grupos, sempre perto da água. Em caso de ataque, basta dar um mergulho.
Os animais da espécie são gregários, vivendo em bandos de 12 a 20 indivíduos (mas alguns grupos dispersos chegam a contar com 100 membros, mas são ajuntamentos provisórios), comandado por um macho alfa.
Se você decidir ter uma capivara como animal de estimação, provavelmente ela transferirá para você o papel de líder, assim como fazem os cães. Um macho dominante mantēm a posição por três anos ou mais, apesar de sempre desafiado por outros machos.
No entanto, mesmo havendo brigas e disputas, aparentemente as capivaras são “do bem”. Zoólogos dificilmente observam casos de expulsão. Ao que tudo indica, os machos briguentos são importantes para defender o bando dos predadores.
Na natureza, existe a figura do macho número dois. Apesar de o líder ser o responsável principal pelo acasalamento, o “sub” pode cobrir até um quarto das fêmeas, que não parecem se organiza hierarquicamente.
No entanto, você decida não ter apenas uma, mas várias capivaras como animais de estimação, e por acaso adotar apenas fêmeas (é difícil diferenciar os sexos), uma delas assumirá a liderança. Isto já foi observado em zoológicos.
Lembre-se: as capivaras sofrem bastante com a deficiência de vitamina C, carência que pode provocar escorbuto, doença caracterizada principalmente pela queda de pelos e pela inflamação e sangramentos nas gengivas. Em cativeiro, é preciso suplementar a alimentação.
“Maus” hábitos
Capivaras praticam cecotrofia. Isto significa que elas digerem os alimentos duas vezes. Na primeira vez, o alimento semidigerido escorre desde o ceco (a primeira porção do intestino grosso) através do ânus e é reengolido para a digestão definitiva. Pode parecer nojento para nós, mas é um procedimento fisiológico fundamental para elas.
A cecotrofia acontece de dez a 12 horas depois de cada refeição. É uma forma eficiente de aproveitar os polissacarídeos, substâncias aproveitadas na produção energética. E, uma vez que a celulose é a principal fonte de polissacarídeos, eles estão presentes em todas as refeições e lanchinhos.
Pelo menos, as fezes finais (depois da cecotrofia)são secas e apresentam-se em forma ovalada, o que facilita a limpeza. Este material é um bom adubo natural para os seus canteiros e hortas.
Ajuda mútua
Estes simpáticos roedores vivem em simbiose com algumas espécies de aves (simbiose é o relacionamento entre espécies, útil para todos os envolvidos). As capivaras servem de poleiro ou como batedores (conforme se movimentam, elas espantam insetos escondidos).
Você precisa conferir se existem aves das seguintes espécies na sua região: carcará, chupim, joão-de-barro, gavião-carrapateiro e suiriri (bem-te-vi-de-coroa). São elas as comensais das capivaras. Elas comem os insetos espalhados pelos pets (!), que, em troca, se livram das moscas importunas e de parasitas, como carrapatos.
Veja se a capivara não merece ser um animal de estimação: quando ela visualiza um gavião-carrapateiro, por exemplo, deita-se de barriga para cima. Não é exatamente para receber carinho, mas, com o gesto, ela se livra dos parasitas (ou de boa parte deles, pelo menos).
A fala
As capivaras são tagarelas, mas ainda não se conhece bem a linguagem destes animais. Sabe-se, no entanto, que as vocalizações são muito úteis na comunicação entre mãe e filhote e podem servir também para evitar que algum indivíduo se desgarre do bando.
A “voz” dos filhotes é semelhante a um guincho, que pode ser ouvido a relativa distância. Os sons mais comuns ocorrem na presença de predadores e lembram os latidos dos cães. Os responsáveis pelo barulho, na maior parte das vezes, são os machos subordinados.
Contudo, quando uma situação de perigo é confirmada, as capivaras ficam totalmente quietas, mergulham quase instantaneamente e formam um círculo com os filhotes no centro, para proteção.
Os predadores naturais da capivara são os jacarés, onças-pintadas, suçuaranas e aves de rapina. Seres humanos também caçam capivaras regularmente, para obter carne e couro.
O nome
O nome dado a estes animais pelos índios tupi não é nada original: “kapi wara” significa “comedor de capim”. O termo capivara é usado em todo o Brasil e apenas no Rio Grande do Sul estes animais são conhecidos também como carpinchos, termo derivado do espanhol.
No norte do país (entre o Amazonas e o Pará), o nome dado à espécie é cupido e, devido à glândula nasal saliente, os machos de capivara são chamados de trombudos na ilha de Marajó. Os machos dominantes apresentam glândulas maiores, mas ainda não se conhece a função delas.
A primeira classificação da capivara ocorreu em 1648, quando um naturalista alemão batizou-a de Brasiliensis porcos fluvialitis (porco do rio). Posteriormente, Carl Linnaeus, em 1758, classificou a espécie como Mus porcelains (junto com o porquinho-da-índia).
Anos depois, o próprio Linnaeus reclassificou a capivara como Sus hydrochaeris, na mesma família dos porcos. Finalmente, em 1762 ganhou um gênero exclusivo para ela. A discussão continua até hoje e a atual classificação foi definida apenas em 2006.
Adaptada para a água
Você já deve fazer encarado de perto uma capivara diversas vezes; afinal, ela é o seu sonho de animal de estimação. Como você já percebeu, trata-se de um animal muito bem adaptado ao meio aquático.
Observe: os olhos e orelhas são plantadas no alto da cabeça, para não ficarem molhadas o tempo todo, e a capivara desenvolveu membranas entre os dedos das patas, para facilitar o nado. Ela tem água até no nome científico.
As orelhas ficam ainda mais eretas e destacadas em situações de perigo. Por isto, quando você perceber, na sua capivara, as “orelhas em riste”, fique sabendo que ela está assustada com alguma coisa ao redor.
A espécie
A capivara (Hydrochoerus hydrochaeris) é um mamífero roedor. Distribui-se por todo o território brasileiro, pelos demais países amazônicos e pode ser encontrada também no Uruguai e no norte da Argentina, nas regiões de banhado dos pampas.
Ela é o maior roedor do mundo, atingindo 50 kg e medindo 1,20 m de comprimento e 60 cm de altura (mas foram encontrados espécimes no interior de São Paulo com peso de 90 kg). Os indivíduos menores são encontrados na Colômbia, Venezuela e Panamá.
A pelagem da capivara é densa e impermeável, em tons que variam do castanho-escuro ao avermelhado.
Os machos apresentam uma glândula na ponta do focinho, mas o dimorfismo sexual não é pronunciado. Os testículos dos machos são protegidos pela pele inguinal e o pênis fica oculto numa dobra próxima ao ânus.
Ela se torna sexualmente madura entre 18 e 24 meses de idade e as fêmeas, depois de 140 dias, dão à luz ninhadas de dois a oito filhotes, que já nascem com pelos e dentição permanente. Em cativeiro — ou no caso de uma adoção por humanos —, uma capivara chega aos 12 anos de idade.
Trata-se de um parente próximo das cutias, pacas, preás e porquinhos-da-índia. Os ambientes que ela povoou estão sempre associados a rios, lagos e pântanos, mas ela pode ser vista tanto ao nível do mar, quanto a 1.300 metros de altitude.
Outra característica da espécie é que ela é extremamente adaptável (por isso, conseguiu adaptar-se até a falta de condições das margens do rio Pinheiros, um dos afluentes do Tietê). Ela é capaz a sobreviver inclusive em ambientes alterados pelo homem e, na presença de jacarés, “trocam o dia pela noite”, isto é, concentram as atividades (alimentação, acasalamento) no período noturno, em que os répteis são menos ativos.
Fósseis indicam que animais muito semelhantes às capivaras — apesar de bem mais pesados, com cerca de 200 kg — já habitavam a América do Sul há cinco milhões de anos, no final do período Plioceno. Estes ancestrais já viviam em bandos e preferiam os ambientes semiaquáticos.
O pet
Grandalhona ela é, mas o aspecto é o de um porquinho-da-índia. A cauda é pequena e vestigial (sem funções anatômicas conhecidas na atualidade). A pele é ondulada, fazendo os pelos surgirem em camadas. A capivara é uma fofa, em outras palavras.
A cabeça da capivara é grande e as orelhas, pequenas, com pregas que fecham as aberturas do ouvido interno. As pernas são curtas e as patas traseiras, mais longas do que as dianteiras.
As capivaras apresentam quatro dedos nas patas dianteiras e três nas traseiras. Os dedos são radiais e unidos por pequenas membranas.
Na hora de alimentar a sua capivara, lembre-se de que ela é um animal exigente. elas preferem as gramíneas ricas em proteínas, tanto terrestres quanto aquáticas. Procure plantar leguminosas misturadas ao capim.
Caso você tenha uma horta, será necessário cercá-la. São relativamente comuns os casos de danos a plantações provocados por bandos de capivaras. Elas, como qualquer outro animal (com exceção do homem) não fazem distinção entre hortaliças e ervas daninhas.
A capivara pode ser facilmente domesticada. Trata-se de um animal limpo e dócil, que consegue interagir com seres humanos. Mas ela precisa sempre da companhia de outras capivaras, por ser um animal gregário.
Os machos são bastante territorialistas e, para mantê-los em casa, a castração é recomendada a partir dos nove meses de idade. Além de impedir uma superpopulação não desejada, também torna os animais menos agressivos. Os machos costumam marcar o território com urina (assim como os cachorros) e a castração reduz este hábito.
Em função da pelagem, rala em algumas áreas (especialmente as articulações), as capivaras são sujeitas a insolações. É necessário providenciar um cantinho à sombra e, se possível, uma poça de lama, onde elas possam se refrescar e nutrir a pele.
As grandonas sabem demonstrar afeto e conseguem aprender alguns truques básicos. Você pode ensiná-las a pedir comida, sentar-se, deitar-se, etc. Com as vocalizações, elas podem indicar satisfação, alerta e submissão, por exemplo. Basta que você aprenda o idioma delas.
O estado de conservação
De acordo com a IUCN (sigla em inglês para União Internacional para Conservação da Natureza), a capivara não é um animal ameaçado pela ação do homem.
Ela está classificada na categoria LC — “least concern”, ou pouco preocupante. Por enquanto, a capivara está segura.
No Brasil, o maior risco para a espécie se encontra no desmatamento, para aberturas de novas áreas para a agropecuária, e no represamento de água em açudes, que reduz as áreas alagadas. No entanto, em algumas regiões, o mato baixo mantido para o gado (sem grandes arbustos e árvores) provocou um aumento da população das grandonas.
A caça é a maior preocupação, mas já existem criações de capivaras para abate. Os produtos mais procurados são o couro, considerado de alta qualidade (para a produção de jaquetas, luvas e cintos, bem como de selas e rédeas para cavalos), e o óleo (a gordura derretida do animal), usado para o combate de doenças respiratórias e do reumatismo.
A carne de capivara não é apreciadas em todos os lugares, uma vez que o cozimento exala cheiro forte e a ingestão com a gordura é de difícil digestão e pode provocar alergias de pele em indivíduos suscetíveis. Mesmo assim, é consumida seca na Venezuela e em forma de linguiças na Argentina.