Hachiko, o cão mais leal do mundo, completa 100 anos

Em 2023, celebra-se o centenário de Hachiko, que é considerado o cão mais leal do mundo.

A história deste cão banco e creme, registrada em livros e filmes, é bem conhecida. Hachiko foi um cão akita japonês, nascido em 10.11.1923 – neste ano, o peludo que ficou conhecido como o cão mais leal do mundo, completaria cem anos. Os cinófilos japoneses estão em festa, celebrando o centenário.

Hachiko tornou-se um símbolo de lealdade a toda prova. Ele nasceu em Odate, na província de Akita, no norte de Honshu, a maior ilha do arquipélago japonês. Meses mais tarde, no início de 2024, ele foi adotado por Hidesaburo Ueno, um professor do departamento de agricultura da Universidade Imperial de Tóquio.

O akita foi levado para Shibuya pelo pai adotivo, que lecionava na capital do país. O professor viajava diariamente de Shibuya para Tóquio (uma distância de 6,5 km). No retorno, Hachiko esperava o tutor amigo na estação ferroviária.

Hachiko cem anos

O pet recebeu um nome que pode ser traduzido como “Senhor Oito” (hachi, em japonês, significa oito e kô é um sufixo utilizado para identificar os antigos senhores feudais do país). A convivência da dupla sempre foi muito próxima: Hachiko fazia questão de acompanhar o tutor todos os dias, na ida e na volta da estação.

Ele aprendeu o trajeto rapidamente e, na época, era costumeiro deixar os cachorros perambulando pela vizinhança. Muitos vizinhos do Professor Ueno conheciam Hachiko pessoalmente e sempre interagiam quando o encontravam nas ruas.

A separação

A convivência entre Hachiko e Hidesaburo, infelizmente, não durou muito tempo. Depois de apenas um ano e quatro meses em que o akita compareceu fielmente à estação de trem para “buscar” o tutor e levá-lo para casa, o professor teve um mau súbito enquanto estava na universidade.

Em 21.05.1925, Ueno sofreu um acidente vascular cerebral durante uma reunião de docentes no trabalho. A morte foi fulminante. A amizade entre Hachiko e o professor durou poucos meses. Mas o akita fez questão de demonstrar a mesma lealdade de sempre.

Durante todos os dias restantes da sua vida, o cachorro compareceu na estação ferroviária, sempre ao cair da tarde, talvez em busca do amigo perdido. Hachiko viveu até 08.03.1934 e manteve a rotina durante quase nove anos.

A proximidade entre os dois amigos já era conhecida, tanto pelos vizinhos, quanto por trabalhadores e usuários da companhia ferroviária. Mesmo assim, todos ficaram surpresos e muito comovidos ao observar que Hachiko continuou fazendo o mesmo trajeto, até o fim da vida.

O akita nunca se importou com as condições do tempo: estando ao lado do tutor, estava tudo certo para ele. Ele saía de casa embaixo de chuva ou de sol para acompanhar o professor. Não foram poucas as vezes em que ele enfrentou nevascas para chegar e sair da estação.

A repercussão

Muitas histórias são contadas sobre a amizade entre o tutor e o cachorro e, claro, sobre a lealdade irrestrita que Hachiko demonstrou. Alguns parentes contaram que, na noite do velório (era tradição velar os corpos na própria residência), Hachiko, que estava preso no quintal, quebrou a porta de vidro da casa e passou a noite deitado ao lado do professor.

Outros contam que o akita recusou alimento durante todo o tempo em que o corpo permaneceu sendo velado por parentes e amigos. Surgiu inclusive um depoimento exagerado: no momento de fechar o caixão, Hachiko pulou sobre o corpo do tutor e tentou de tudo para fazê-lo voltar à vida.

Seja como for, as idas diárias à estação de Shibuya permaneceram constantes, sempre no mesmo horário, durante nove anos. Hachiko se tornou gradualmente um símbolo da amizade e da lealdade.

Depois que Ueno morreu, a família decidiu levar o akita para a casa de parentes em Asakusa, na região metropolitana de Tóquio, mas Hachiko conseguiu fugir várias vezes, retornando para Shibuya. Um ano depois, ele foi viver com o jardineiro que cuidava das plantas do professor – que conhecia o cachorro desde que era filhote –, mas também fugiu desta casa inúmeras vezes.

Hachiko cao cem anos 3

Hachiko manteve o ritual durante anos. Mesmo tendo percebido que o professor não retornaria, ele continuou se apresentando na estação ferroviária, vagando entre os passageiros, observando aflito, à espera da visão do amigo inesquecível.

Parentes e amigos de Ueno precisavam ir à estação para levar o akita de volta para casa, mas ele resistia em deixar a gare e só retornava quando a fome e às vezes o frio o obrigavam.

Certo dia, um antigo aluno do Professor Ueno observou Hachiko esperando na estação. Na volta, ele decidiu segui-lo e conheceu alguns parentes, da família Kobayashi, que contaram a história de lealdade do animal.

O estudante pesquisava sobre cachorros e escrevia em alguns jornais locais. Ele redigiu alguns artigos e, em 1932, a história de Hachiko foi publicada pelo Asahi Shimbun, até hoje um dos periódicos de maior circulação do Japão. A partir daí, todo o povo conheceu a história de Hachiko e sua devoção ao tutor.

O cachorro se tornou uma espécie de celebridade local. Muitos viajantes desciam na estação de Shibuya, aos finais de tarde, apenas para observar Hachiko, que já era considerado um sinônimo de lealdade no país. Alguns professores passaram a levar as crianças para conhecer o akita, aproveitando para abordar temas como a importância da amizade.

A morte de Hachiko, em 1935, foi estampada na capa dos principais jornais japoneses e gerou forte comoção popular. Mesmo doente (ele tinha um câncer terminal), o akita cumpriu o ritual até o último dia da vida.

Os restos mortais de Hachiko foram incinerados e as cinzas, depositadas do Cemitério de Aoyama, em MInato, onde estão até hoje, ao lado das do tutor. Os pelos foram usados para a criação de uma escultura, atualmente exposta no Museu Nacional de Natureza e Ciência do Japão, em Tóquio.

Em 21.04.1934, menos de dois meses após a morte, uma estátua em bronze de Hachiko, esculpida por Tem Ando (um renomado artista japonês), foi instalada em frente à bilheteria da estação ferroviária de Shibuya. Junto à obra, foi gravado um poema com os dizeres: “Linhas para um Cão Leal”. A inauguração contou com a presença de um neto do professor e de centenas de pessoas, entusiastas da lealdade ao tutor demonstrada por Hachiko durante tantos anos.

Nas últimas décadas, outras estátuas em homenagem a Hachiko foram instaladas em diversas cidades do Japão. Há esculturas em Odate (a cidade natal do tutor), na Universidade de Tóquio e até mesmo no cemitério de Rhode Island, um dos cenários de “A Dog’s Story”.

Mais homenagens

A estátua de Hachiko foi derretida durante a Segunda Guerra Mundial, para angariar fundos para o conflito. Em 1948, foi instalada uma nova escultura – desta vez, obra de Takeshi Ando, filho do artista da primeira homenagem. O local se tornou um conhecido ponto de encontro dos japoneses.

Hachiko cem anos

Em 1987, estreou nos cinemas japoneses “Hachiko Monogatari” (em tradução livre, “O Conto de Hachiko”). Em 2009, um remake americano tornou o akita mundialmente famoso: “Hachiko, a Dog’s Story” (Hachiko: a história de um cão. No Brasil, o filme foi apresentado com o título “Sempre ao Seu Lado”).

O filme americano, dirigido por Lasse Hallström e protagonizado por Richard Gere e Joan Allen, proporcionou uma receita de US$ 49 milhões. A estreia ocorreu no Japão, em agosto de 2009. O filme chegou ao Brasil dois meses depois.

Todo dia 8 de março é realizada uma cerimônia solene para celebrar a vida, a dedicação e a lealdade de Hachiko. Em 2015, em homenagem aos 80 anos da morte do akita, alunos da Faculdade de Agricultura da Universidade de Tóquio se cotizaram para a criação de uma nova escultura, desta vez simbolizando o reencontro de Ueno e Hachiko.

Hachiko também foi homenageado em um episódio de Futurama, intitulado “Jurassic Bark” (um latido jurássico, uma brincadeira com “Jurassic Park”). O protagonista encontra Fry encontra restos fossilizados de Seymour, o seu cachorro de estimação.

Fry decide clonar o animal, mas desiste, imaginando que o cachorro se cansou de esperar quando o cientista foi congelado. No final do episódio, Fry descobre que Seymour esperou por ele durante 12 anos, até a morte, exatamente como Hachiko.

Homenagens a Hachiko também estão presentes em animes japoneses, como Nana, Fortune Dogs e Inu Yasha. No filme “Scooby-Doo e a Espada Samurai”, a estátua do akita é apresentada enquanto a personagem Velma explica o mistério que a turma está investigando.

Diversos eventos estão planejados para celebrar a lealdade e a amizade encarnadas em Hachiko no decorrer deste ano. As esculturas do akita, verdadeiros pontos turísticos japoneses, concentram as festividades para novembro. A Universidade de Tóquio pretende reunir textos e vídeos sobre a lealdade canina e os filmes que contam a história de Hachiko já estão programados para os próximos meses.

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