Por que meu cachorro tenta me lamber?

Todo tutor se faz esta pergunta: por que o meu cachorro tenta me lamber? A resposta é: basicamente, por amor.

Gostando ou não do gesto – muitos tutores acham que as lambidas são mostras de carinho, enquanto outros consideram que é apenas falta de higiene –, muita gente quer saber: “por que meu cachorro tenta me lamber?”. Existem várias razões e a primeira dela é bem simples: porque os nossos pets querem nos agradar.

Especialmente depois de longas ausências (que, em alguns casos, podem ser de apenas alguns minutos), é comum que eles avancem festivos, mais do que prontos para pular no nosso colo e encher o nosso rosto de lambidas. Os “cumprimentos” traduzem pura alegria. Pode-se dizer que as lambidas são beijos caninos – são “lambeijos”.

Os motivos para seu cachorro te lamber

Não se preocupe: o seu cachorro não tenta lamber você para provar o sabor e definir se você é uma boa opção para o almoço ou o jantar. Aliás, o paladar não é um sentido muito apurado entre os cães. Na natureza, de onde eles vieram (e nós também, mas há muito mais tempo), o importante é a comida, e não o sabor dela.

O paladar se revelou muito importante para nós – afinal, tínhamos de identificar quais plantas (folhas, flores, gravetos, raízes, etc.) eram benéficas e quais eram tóxicas. Os cães, naturalmente carnívoros, só precisavam saber se a refeição estava fresca ou já estava estragada.

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Como eles eram caçadores (e continuam sendo, pelo menos nos instintos), a carne estava sempre fresca – a presa tinha acabado de ser abatida. Desta forma, eles desenvolveram principalmente a audição e o olfato – um sentido extraordinário entre todos os canídeos (a família zoológica a que pertencem os cães).

Enquanto a evolução nos dotou com cerca de nove mil papilas gustativas (estruturas responsáveis pelo reconhecimento do sabor das substâncias, presentes principalmente na língua, mas também no nariz e no céu da boca), os cães possuem apenas 1.700. Parece pouco, mas os gatos têm ainda menos: só 450 papilas gustativas em toda a boca.

A visão canina também é limitada. Os cães não reconhecem o vermelho e fazem confusão entre o amarelo, o verde e o azul. Já observou como os cachorros andam? Eles estão sempre com a cabeça baixa, olhando para o chão (por isto, a altura oficial das raças caninas é medida na cernelha, um ponto da coluna vertebral próximo à nuca).

Nós, por outro lado, nos tornamos perfeitamente bípedes. Com isto, começamos a observar o horizonte. Uma bela tacada evolutiva: relativamente frágeis, os nossos ancestrais começaram a observar a presença de predadores ou adversários a uma distância considerável. É bem mais fácil fugir de um tigre-de-dentes-de-sabre quando ele está a dezenas de metros, concorda?

Os cães (aliás, os lobos, os avós dos nossos peludos) não precisaram disto. Continuaram quadrúpedes, mas com uma constituição física bem mais robusta do que a nossa. Visão e paladar perderam espaço para a audição, o olfato (principalmente) e o tato – e esta é uma das razões por que eles gostam tanto do contato físico.

O olfato, como sentido mais importante para identificar as coisas ao redor – não apenas o alimento, mas também a aproximação de um predador, a chegada de uma chuva forte, etc. –, está intimamente ligado às lambidas. Sim, o seu cão tenta lamber você por motivos ancestrais.

A primeira refeição

Quando as cadelas dão à luz, a primeira coisa que fazem é lamber os filhotes, para retirar os restos de líquido amniótico, sangue, etc. É uma medida profilática, mas que também fortalece o relacionamento entre mãe e filhos. Quando a mãe lambe a cria, o cérebro estimula a produção de ocitocina, hormônio responsável pela produção de leite, mas também pelos laços de afeto familiar (inclusive entre humanos).

Os filhotes aprendem rapidinho. Sempre que sentem fome, procuram as tetas da mãe, lambendo-as para estimular a secreção do leite. Depois de alguns dias, os pequenos conseguem localizar a cadela-mãe apenas pelo olfato – e logo correm atrás dela.

Pouco tempo depois, estes “projetos de pets” começam a testar o olfato em todas as outras coisas próximas: os irmãos, os brinquedos, os criadores, etc. É assim que, em pouco tempo, eles começam a se aventurar para descobrir o mundo ao seu redor.

Mas o que a lambida tem a ver com o olfato? Não é o focinho o responsável pela captação dos odores? Nos seres humanos, o córtex visual (parte do cérebro responsável por decodificar as imagens captadas pelos olhos) ocupa a maior parte do espaço. Nos cães, a parte mais desenvolvida é o rinencéfalo (união dos termos “rino”, cheirar, e encéfalo), que parece ter se desenvolvido, nos animais superiores, a partir das estruturas olfativas – nariz e focinho.

Os cães não cheiram apenas com o focinho: eles também usam a boca, onde fica o órgão de Jacobson ou órgão vomeronasal (o osso vômer, nos cães, fica entre a garganta – laringe e faringe – e o focinho). A laringe faz parte do aparelho respiratório (que começa no nariz) e a faringe, do aparelho digestório (que começa na boca).

Esta estrutura garante um número maior de conexões neurais: enquanto a capacidade olfativa humana dos humanos é primitiva, para os cães, este órgão transforma cheiros em verdadeiras revistas de fofocas.

Por exemplo, ao cheirar um cocô deixado na calçada, um cachorro sabe se ele foi feito por um macho ou fêmea (neste último caso, se ela está no cio; no primeiro, se o macho em questão é o alfa da matilha), há quanto tempo o “colega” passou por ali, se ele está ansioso, amedrontado, irritado, etc.

Tudo isto porque, quando um cachorro defeca, ele libera algumas gotas de substâncias produzidas por glândulas perianais (situadas ao redor do ânus), inclusive os feromônios, tipo de matéria responsável pela “química” sexual.

Ao limpar o focinho com a língua, o cachorro transfere informações para a boca, onde são interpretadas pelo órgão vomeronasal. Para nós, estas moléculas não têm cheiro algum, mas, para os cães, são fontes de informação extremamente importantes.

Por isto, boca e focinho trabalham juntos para captar e decodificar os odores. E, por isto também, os cães lambem praticamente tudo: as lambidas são a maneira canina de interpretar o mundo. Quando nós chegamos da rua, estamos saturados de aromas estranhos (para nós, totalmente inodoros).

Nesses momentos, os nossos cachorros unem o útil ao agradável: aproveitam para tentar nos lamber (principalmente a face, mas também as mãos) para expressar a alegria do reencontro, mas também nos identificam (“ok, é ele mesmo”) e sabem de onde nós viemos. Pelo menos, sabem onde pisamos, o que comemos, com quem nos encontramos, etc.

Mas as lambidas têm ainda outra função: lamber a face ou as mãos, além de demonstrar amor e funcionar para a identificação de informações, também é uma forma de respeito. Quando filhotes, is cachorros lambem as mães para expressar submissão.

Em uma alcateia, os lobos são rigidamente estratificados. Existe um líder, uma fêmea dominante, machos submissos, outras fêmeas, animais jovens e filhotes. Para se dar bem no bando, é importante saber a hora de comer, se é possível ou não encontrar um namorado ou namorada, etc.

Os cães transportaram esta hierarquia no convívio com os humanos. Eles entendem a nossa família como uma matilha. Quando o cachorro lambe o seu tutor, ele está querendo reafirmar que aceita o humano como “macho alfa” do grupo e submete-se às suas ordens.

Se você tem mais de um cachorro em casa, comece a prestar atenção: o animal mais submisso (que ocupa a posição mais baixa na hierarquia) é o mais “beijoqueiro”. Ele tenta lamber você e também os outros membros do grupo.

Existe também um motivo egoísta para o cachorro tentar lamber você: mesmo sendo alimentado de forma adequada, ele sempre quer mais (isto não significa que o cão é um esfomeado; apenas que ele não sabe – nem pode saber – quando haverá mais alimentos).

Ele pensa (sim, os cachorros pensam): “quem sabe, se eu lamber a boca dele, meu tutor regurgita um pouquinho da comida cujo cheiro eu estou identificando”. Amor, respeito, submissão e uma pequena dose de egoísmo. É com estes elementos básicos que os cães vivem – e sobrevivem – na nossa companhia.

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