Cachorros conseguem ver TV?

Já existem inclusive canais televisivos específicos para eles. Mas, cachorros conseguem ver TV? O seu cachorro assiste TV?

São incontáveis os relatos de cachorros parados à frente de um vídeo. Em agosto de 2019, o pastor alemão Falco viralizou nas redes sociais ao aparecer ganindo e uivando ao observar as cenas da morte do pai de Simba, do desenho animado “O Rei Leão”. Foram quase dois milhões de views e compartilhamentos em apenas seis semanas. Mas será que os cachorros conseguem ver TV?

Pastor alemão assistindo o desenho animado “O Rei Leão”

“Ver” é um atributo dos videntes – todos os animais que possuem olhos saudáveis conseguem ver alguma coisa. Não é possível, no entanto, afirmar que os cachorros conseguem ver da mesma forma que nós vemos, muito menos que conseguem compreender as cenas que estão sendo transmitidas.

As evidências acumuladas são, por enquanto, apenas especulativas. São anedóticas, no sentido original desta palavra: alguém fala, outro repete, mas ninguém tem certeza de que o fato realmente aconteceu da forma como está sendo narrado.

Os cachorros conseguem reconhecer outros pets na TV – cães e gatos especialmente, imagens às quais estão mais acostumados. Um artigo de 2013 da revista “Animal Cognition” mostrou, em um estudo com nove cães, que todos eles conseguiram reconhecer os amigos em cenas, mas permaneceram sem esboçar reação quando confrontados com imagens de animais selvagens. É uma amostra pequena, mas explicativa.

Cachorros conseguem ver TV? A opinião dos especialistas

Em 2016, um estudo conduzido por pesquisadores do Centro Veterinário Afán de Ribera (Sevilha, Espanha), especializado em etologia canina, reuniu 320 cães (entre chihuahuas, dachshunds e poodles) para identificar eventuais semelhanças de comportamento quando os pets estão à frente da TV.

Deixados à vontade para observar cenas de brincadeiras, maus tratos e interação entre animais, as reações foram as mais diversas. Alguns latiram, outros choramingaram, outros procuraram alguma coisa atrás do aparelho de TV. A maioria, no entanto, não esboçou nenhuma reação significativa.

Além disso, diversos cães se comportaram de maneiras diferentes durante o experimento. Para uma mesma sequência visual, alguns pets latiam em um momento e ignoravam em outro, ganiam ou mostravam-se agressivos, etc.

Ficou comprovado que a conduta exibida era devida em parte ao conteúdo apresentado na TV, mas diversos outros fatores interferiram, como a presença de outros cães na mesma sala, aromas e ruídos, oferta de alimentos e estado geral do cão (cansaço, sono, ansiedade pela ausência do tutor, etc.).

Definitivamente, os cachorros conseguem ver TV, mas a experiência é semelhante à de uma criança pequena, de dois ou três anos. Ela se mantém envolvida por alguns segundos, mas logo a atenção é desviada para um brinquedo, um barulho diferente, a chegada de alguém na sala, etc.

Alguns detalhes do estudo revelam um pouco mais sobre os nossos cachorros. Os poodles prestam mais atenção à TV do que os dachshunds (52% dos poodles, contra apenas 11% dos dachshunds). Isto não significa que os primeiros são mais inteligentes ou bem dotados que os colegas salsichas.

Os poodles foram desenvolvidos para observar a caça no ar e correr para recuperá-la assim que ouvissem o estampido da espingarda. A atenção do dachshund é mais diluída, uma vez que a raça foi desenvolvida para exterminar pragas em jardins e hortas. Para eles, ficar atento apenas a movimentos e ruídos estranhos é suficiente para cumprir a tarefa.0

Outra observação importante: os cães de terapia (animais treinados para fazer companhia para pacientes hospitalizados, residentes de asilos, etc.) prestam mais atenção à TV dos que os animais de companhia – a maioria dos cachorros atuais.

A cada dez cães estudados, seis animais de terapia assistiram à TV durante o experimento, mas apenas dois de companhia acompanharam os programas televisivos. Isto mostra que, treinados para acompanhar pessoas debilitadas, os cachorros acompanham a atividade que está em andamento – em muitos casos, a única que os pacientes conseguem desenvolver.

Cachorro vê ou não vê televisão?

É inegável que os cachorros conseguem ver TV – e reagem às cenas exibidas de acordo com a movimentação. Uma briga, por exemplo, desperta a atenção dos pets e eles podem tentar intervir. Isto significa que os nossos pets são capazes de avaliar uma situação e interferir quando julgam necessário.

Tudo depende, no entanto, do estado de espírito. Um cachorro pode passar vários minutos à frente da TV, mas isto não quer dizer que ele está assistindo ao seu programa favorito. Nossos pets reagem principalmente ao volume e à intensidade das cores (algo semelhante à reação de bebês frente aos Teletubbies), mas alguns fatores podem interferir nesta percepção.

Caso eles estejam interessados no movimento que está sendo transmitido – mesmo que estejam muito entretidos –, podem quase imediatamente desviar a atenção para assuntos mais urgentes, como o barulho de uma buzina ou de passos no corredor, um cheiro familiar ou completamente desconhecido, etc.

A ansiedade também altera a capacidade de os cachorros manterem a atenção na TV. Se um dos tutores costuma voltar para casa diariamente às 18h, não há programa televisivo que o faça afastar-se da porta da rua quando a chegada está e aproximando.

O que cachorros veem?

É natural que cachorros consigam identificar outros cachorros na TV – e também gatos e aves, caso estejam acostumados ao convívio com estes pets em casa. Mas a visão canina é significativamente diferente da nossa.

Na projeção de imagens em vídeo, nós captamos os estímulos visuais através de três faixas: vermelho, verde e azul (a preparação das imagens em estúdios segue este padrão – RGB, em inglês). A visão canina não capta ondas mais lentas (abaixo de 60 Hertz): eles enxergam basicamente os azuis e amarelos.

Além disso, as produções visuais produzidas para humanos projetam 24 quadros por segundo. Isto dá a ilusão, para o nosso cérebro, de que as imagens estão em movimento. Nas televisões antigas, estas imagens eram projetadas em uma frequência de 60 Hertz (as TVs de LED usam frequências próximas a 100 Hertz).

Desta forma, nas TVs de tubo, os cachorros observavam uma sequência semelhante à de uma projeção de slides: diversas fotos sendo apresentadas sequencialmente. A tecnologia avançou e hoje os peludos conseguem desfrutar melhor a alta definição televisiva. É mais provável que um cachorro acompanhe um programa de TV do que o faziam os seus ancestrais 20 ou 30 anos atrás.

TVterapia

Os medos também interferem. Cachorros que têm pavor de barulhos altos, como o som de trovões, desviarão a atenção do “programa favorito” caso esteja ameaçando cair um temporal com raios e trovoadas. A TV, no entanto, pode ser útil para fazê-lo esquecer-se da ameaça.

Caso ele goste de um desenho animado muito colorido e agitado, por exemplo, os tutores podem colocar este programa nos momentos de tempestades. Trata-se de um processo de descondicionamento: os pets aprenderam a ter medo de trovões e podem desaprender.

Na verdade, os peludos não aprenderam a ter medo dos ruídos intensos. Não se trata de um comportamento adquirido, mas de uma resposta ancestral: na aproximação de um temporal, qualquer animal tende a procurar um local seguro, seco e aquecido.

O que os pets aprenderam na convivência com os humanos foi a demonstrar o medo, uma forma de chamar a atenção dos tutores e provocar alguma atitude de defesa – afinal, os humanos são os líderes da matilha na mentalidade canina; cabe a nós a defesa do bando.

Mas, para dissociar o barulho do medo, a TV sozinha não é suficiente. É preciso uma boa dose de paciência para ficar ao lado do pet durante a tempestade. Os sons e imagens do programa, aliados a alguns afagos e carinhos, progressivamente desviarão o foco do trovão para o movimento televisivo.

Bastam duas ou três tentativas. Nos temporais seguintes, o “programa favorito” será suficiente para fazer o pet relaxar. Em pouco tempo, ele conseguirá perder o medo da chuva, sem necessidade da companhia dos tutores.

A TV também pode ser uma excelente companheira para cachorros que passam várias horas do dia sozinhos em casa. Para isso, é necessário programar o aparelho para ligar em determinado horário (o início da tarde, por exemplo), em um programa que chame particularmente a atenção dos pets.

Se a TV permanecer ligada o tempo todo, em poucos minutos, o cachorro desviará a atenção tantas vezes que, em pouco tempo, nem perceberá o áudio e vídeo que são transmitidos. As imagens e sons passam a fazer parte da “paisagem comum” do ambiente.

Quando o aparelho é ligado “num passe de mágica”, o pet ficará atento – pelo menos por alguns minutos – e isto é suficiente para reduzir a ansiedade e o tédio que se avolumam quando estamos sozinhos.

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